Técnicos e especialistas avaliam indicadores de resiliência individual no Rio
O Rio de Janeiro encanta pela exuberância natural e ao mesmo tempo desafia urbanistas e seus 6,4 milhões de habitantes com o rápido crescimento e características geográficas muito particulares. A cidade se desenvolveu entre o mar e as montanhas, cercada pelo Oceano Atlântico, as Baías de Guanabara e Sepetiba e conta ainda com as duas maiores florestas urbanas do mundo, a Floresta da Tijuca e o Maciço da Pedra Branca. Essa combinação natural somada às construções em morros e encostas aumentam o risco de desmoronamentos, inundações e outros danos à integridade dos residentes em situações extremas.
Para enfrentar esses momentos de crise e de risco à vida, os moradores precisam de conhecimentos e ferramentas, que começaram a ser estruturados no Workshop de Avaliação de Indicadores de Resiliência Individual, nesta quinta-feira (15), no Instituto Pereira Passos (IPP). O encontro foi promovido pelo WRI Brasil Cidades Sustentáveis e Prefeitura do Rio de Janeiro e é mais um passo do programa Rio Resiliente, lançado no início do ano para elaboração do Plano de Resiliência da capital fluminense. As especialistas Magdala Arioli e Katerina Elias Trostmann, do WRI Brasil, conduziram as atividades dessa tarde ao lado de Sergio Besserman, Presidente do IPP, e Luciana Nery, Gerente de Resiliência do Centro de Operações (COR).
Katerina, do WRI Brasil, apresenta indicadores ao grupo. (Foto: Maria Cavalcanti / WRI Brasil Cidades Sustentáveis)
Participaram do workshop técnicos de diferentes secretarias da Prefeitura, Defesa Civil, Programa Rio Resiliente e do Instituto Pereira Passos, além de pesquisadores, médicos, voluntários e representantes de iniciativas parceiras, como a C40, envolvidas com a elaboração do plano. Cristina Mendonça, Diretora da Cidade do Rio de Janeiro da C40, e Marcio Motta, Chefe da Defesa Civil do Rio de Janeiro, também vivenciaram as atividades dessa tarde.
“Queremos construir um trabalho em conjunto com todos. A participação de cada um será importante para captarmos as prioridades a partir de diferentes secretarias, experiências e visões”, explicou Magdala Arioli, Coordenadora de Projetos de Transporte e Clima do WRI Brasil Cidades Sustentáveis. Para o Sergio Besserman, as definições de hoje são urgentes para delinear um futuro mais próspero às nossas cidades. “Estudos apontam que os impactos das mudanças climáticas podem nos fazer perder todo o trabalho contra a pobreza dos últimos 20 anos. Definitivamente não queremos isso”, enfatizou.
Luciana Nery e Sergio Besserman. (Foto: Maria Cavalcanti / WRI Brasil Cidades Sustentáveis)
Os moradores das áreas de risco são agentes fundamentais à resiliência urbana uma vez que são os primeiros a ser afetados e a responder aos impactos ocasionados por desafios urbanos e choques naturais, que a cada ano se acentuam devido às mudanças climáticas. As principais ameaças mapeadas no Rio são chuvas e ventos fortes; ondas e ilhas de calor; elevação do nível máximo do mar; epidemia local como a dengue; seca prolongada; saturação da infraestrutura viária; aglomerações de pessoas em grandes eventos; e ações criminosas. “Em 2050, estima-se que 255 milhões de pessoas serão refugiadas de situações extremas do clima, e é provável que o Rio abrace esses imigrantes. Precisamos estar preparados”, pontuou Besserman.
Assim, o workshop dessa tarde analisou prioridades de ações e ferramentas para reduzir a vulnerabilidade do cidadão, aumentar a capacidade de adaptação e da equidade social, bem como incentivar comunidades a ter uma maior cultura colaborativa e indivíduos mais preparados. A análise foi possível por meio da avaliação de indicadores pré-estabelecidos a partir da pesquisa de Katerina Trostmann, Analista de Pesquisa do WRI Brasil. São eles:
Indicadores comunitários:
- Coesão social: a interconexão, comunicação e apoio dentro de uma comunidade.
- Alcance institucional: a relação de canais de comunicação entre a comunidade e o governo municipal.
Indicadores individuais:
- Percepção de risco: como cada indivíduo percebe a probabilidade e a gravidade de um desastre climático.
- Preparação: a preparação e autoconfiança de um indivíduo sobre desastres climáticos.
- Comunicação: acesso de um indivíduo a tecnologia de comunicação e potencial para o isolamento durante um evento emergencial.
- Conhecimentos e competências: conhecimento de um indivíduo sobre riscos climáticos e habilidades para lidar com eles.
- Recursos econômicos: o acesso ao financiamento em caso de emergências, e qual a flexibilidade das fontes de renda dos indivíduos, incluindo opções alternativas de subsistência.
Os participantes foram divididos em pequenos grupos relacionados a cada um dos indicadores. A partir da discussão conjunta, estabeleceram prioridades e sugestões a ser consideradas no resultado final. Há relação direta entre o comportamento do indivíduo e os possíveis impactos negativos em seu próprio modo de vida. É comprovado que com a incorporação de certos hábitos, como a disposição correta do lixo, o uso do transporte coletivo e a economia de água, é possível tornarmos a cidade mais resistente a situações extremas e desafios urbanos. “Empoderar o cidadão faz avançar muito a recuperação e a reação após um choque, pois ele tem um conhecimento profundo do local em diferentes níveis”, explicou Katerina Trostmann.
Hábitos, comportamentos, níveis de percepção são alguns dos fatores que influenciam diretamente o grau de resiliência urbana. Marcio Motta, chefe da Defesa Civil, observou que é inclusive centros religiosos devem estar envolvidos, uma vez que são espaços amplos e de alta influência social no momento de receber e organizar a população em situações de crise. Outro fator importante discutido entre os participantes foi o da comunicação sobre os riscos, sem alarmismo, a partir de veículos de alto poder de difusão e pouca dependência elétrica, como o rádio. “O rádio tem um lugar histórico de informação às pessoas. É interessante notar que a mídia mais antiga de todas tem um papel fundamental para o problema urbano mais novo de todos: a resiliência”, observou Besserman.
Para os especialistas presentes, também é preciso aproveitar o trabalho que já foi feito em diferentes frentes, como o rastreamento de áreas de risco e combate à dengue. As pessoas que utilizam telas nas janelas, por exemplo, são potenciais agentes para incorporar outros hábitos resilientes. “É muito importante somar o trabalho mapeado aqui com as ações que já existem junto a Defesa Civil e outras secretarias e pesquisas”, lembrou Katerina Trostmann ao final do encontro.
Discussões em grupo durante a atividade desta quinta-feira. (Foto: Maria Cavalcanti / WRI Brasil Cidades Sustentáveis)
"O conceito de resiliência é muito transversal, por isso, vimos aqui hoje pessoas da saúde, habitação, diversos setores da prefeitura. Juntar todos estes atores em um mesmo ambiente para discutir um assunto tão relevante é extraordinário. Somente assim podemos construir uma definição cada vez melhor de resiliência, tanto individual quanto comunitária. Agradeço por essa oportunidade de debate hoje", exaltou Marcio Motta.
COR e um Rio mais resiliente
O programa Rio Resiliente aponta as principais orientações da cidade para enfrentar impactos e se adaptar a choques e estresses crônicos causados pelas mudanças climáticas e pelos desafios urbanos. Sua coordenação é feita a partir do COR, que opera 24 horas por dia, monitorando chuvas, trânsito, riscos de incêndio e a temperatura.
O modelo de governança do centro integra 30 agências municipais, estaduais e de utilidades públicas, envolve ativamente as comunidades por meio de treinamento e se comunica de forma proativa com os residentes. A partir do COR são lançados alertas por meio da imprensa e de redes sociais, além de receber mensagens diretas da população por meio do aplicativo Olhos da Cidade.
Entenda a Resiliência Urbana
A resiliência urbana é a capacidade de indivíduos, comunidades, instituições, empresas e sistemas dentro de uma cidade de sobreviver, adaptar-se e crescer, independente dos tipos de estresses crônicos e choques agudos que vivenciam. Os choques são aqueles que exigem uma ação imediata, por terem impactos que podem levar a cidade a sair de sua rotina. Já os estresses crônicos resultam de tendências de longo prazo, principalmente relacionadas ao clima, à área social, a situações demográficas e a mudanças econômicas.
Uma cidade resiliente é aquela que consegue fortalecer suas estruturas e serviços, de forma que a sua população sofra cada vez menos com impactos ocasionados por choques, estresses crônicos, catástrofes e desastres. São exemplos desses eventos: inundações, terremotos, incidência de furacões, deslizamentos de encostas, falta d’água, fortes ondas de frio ou calor, greves de transporte ou serviços essenciais, epidemias e outros.
100 Cidades Resilientes
Em 2013, o Rio de Janeiro entrou para a lista das 32 primeiras cidades selecionadas para a rede "100 Cidades Resilientes" da Fundação Rockefeller. Com o projeto, o Rio ganhou suporte técnico para implantar a competência da resiliência no município, além de ter a possibilidade de trocar experiências com outras cidades, como Medelín (Colômbia), Melbourne (Austrália) e Nova Orleans (EUA).
O projeto forma uma rede global de cidades resilientes para compartilhar boas práticas e informações, para que elas superem desafios urbanos como as áreas de risco ou irregulares, vulneráveis às chuvas, enchentes e deslizamentos. O objetivo é tornar as cidades mais bem preparadas para resistir a eventos extremos, sejam naturais ou causados pelo homem, e aptas a se recuperar rapidamente, saindo mais fortes do que antes.
Ao lado do Rio, a outra cidade brasileira da rede é Porto Alegre (RS) que recebeu a atividade na semana passada.