Projetos DOTS têm o potencial de qualificar os espaços urbanos
O Desenvolvimento Orientado ao Transporte Sustentável (DOTS) pautou o workshop de mesmo nome que aconteceu esta semana no Rio de Janeiro, organizado pelo Banco Mundial em parceria com o WRI Brasil Cidades Sustentáveis e a Câmara Metropolitana do Rio de Janeiro. Entre os dias 9 e 11 de novembro, uma série de palestras e discussões ministradas por especialistas e gestores públicos ofereceram ao público participante uma oportunidade de aprofundar os conhecimentos a respeito do desenvolvimento urbano sustentável.
Robert Cervero foi um desses especialistas. O professor e diretor da Universidade da Califórnia é doutor em planejamento urbano e um reconhecido pensador da área. Na manhã desta sexta-feira (11), Cervero encerrou o evento analisando questões relativas ao DOTS e falando de alguns exemplos de cidades que foram bem-sucedidas na aplicação do modelo.
“Além da qualidade do serviço, todo transporte coletivo envolve, na maioria das vezes, uma caminhada até a estação. Por isso, é preciso trabalhar na qualidade do ambiente urbano. Investindo nisso, temos a oportunidade de qualificar as áreas metropolitanas. É uma função logística e operacional ver essas regiões como um lugar mais sustentável, inclusivo e atraente”, afirmou o especialista, destacando que essas áreas precisam ser pontos de encontro das pessoas, com atrações de lazer, serviços e cultura.
A função de um sistema de transporte planejado sob os moldes do DOTS é fazer a população circular pela cidade, conectando atividades e fazendo com que o espaço urbano priorize os pedestres. “Na França, o design das cidades deixou o centro livre de carros. Para sair da região central, é preciso usar trem ou ônibus. E ao redor das estações há diversas atividades disponíveis. Já em Estocolmo o sistema foi criado para acalmar mais o trânsito, usando a terra para construir playgrounds e jardins comunitários, entre outras opções”, exemplificou Cervero.
Cervero: DOTS traz benefícios estruturais, ambientais e econômicos às cidades (Foto: Elis Bartonelli)
Além de criar novos ambientes no entorno de estações de transporte, projetos DOTS são excelentes aliados no combate à degradação do meio ambiente. Conforme pontuou o professor, o modelo ideal de um projeto DOTS deve contar com infraestrutura para o uso da bicicleta e para a circulação a pé, o que ajuda na redução do tráfego de veículos e das emissões de poluentes: “Tudo começa com o desestímulo ao uso do carro. A fusão do urbanismo verde com o DOTS traz grandes benefícios nesse sentido. Fizemos um estudo e descobrimos que, quando existem áreas verdes no entorno das estações de transporte, há uma redução de um terço nas emissões de carbono”.
Apesar das dificuldades, o Brasil aparece na lista dos exemplos bem-sucedidos na implementação do sistema. Na visão de Cervero, Curitiba, capital do Paraná, qualificou sua mobilidade urbana baseada nos pilares de um sistema de transporte orientado ao desenvolvimento sustentável: “Lá, há o corredor de transporte com cinco módulos fazendo um bom uso da terra. Alguns dos módulos têm mais moradia; outros, prédios de escritório; outros ainda, atrações culturais ou uma área mais comercial. Com diferentes serviços e espaços interligados por um corredor de transporte, há circulação de pessoas o dia todo. Isso estimula a economia, melhora a segurança, e os trens ou veículos de transporte coletivo não ficam vazios, o que gera um ótimo custo-benefício”, explicou. Na América Latina, Cervero destacou ainda Bogotá, capital da Colômbia, como referência. De acordo com ele, a cidade tem um dos melhores sistemas BRT em operação no mundo e conseguiu atingir um bom nível de pessoas circulando pelo transporte.
A preocupação com a arquitetura dos espaços também é fundamental para o planejamento e o sucesso do DOTS. Cidades que conseguiram tornar a região das estações de transporte mais atraentes do ponto de vista estético também tiveram êxito no sistema de transporte em si. “É preciso focar no mercado e também se certificar de que as áreas ao redor das estações tenham capacidade de abrigar a comunidade. Se há quadras com prédios de uso misto, infraestrutura cicloviária, escolas, bibliotecas, áreas de lazer. Sem falar nas contribuições para o desenvolvimento da economia local”, avaliou Cervero.
A implementação de novos espaços e serviços em torno dos eixos e estações de transporte coletivo acaba aumentando a densidade populacional na região. Assim, um dos desafios das cidades ao aplicar o DOTS como modelo de planejamento é manter espaços agradáveis e acessíveis sem que se tornem excludentes para a população de baixa renda. Hong Kong, aponta o especialista, é uma das cidades que investiu nos espaços públicos de qualidade: “O entorno dos acessos ao transporte coletivo era feio. Depois do trabalho de urbanistas, a cidade mudou radicalmente essas áreas. Isso aumentou em 25% o lucro. É preciso ter um fundo dedicado a isso, mas o retorno é garantido depois – áreas urbanas mais bem cuidadas geram lucros”.