Oficina procura soluções para pontos críticos de segurança viária de Belo Horizonte
Projetos urbanos pensados décadas atrás podem não se adequar mais ao cenário atual de explosão populacional e do uso crescente de automóveis particulares nas grandes cidades. Diante dessa realidade, muitas áreas urbanas precisarão se redesenhar para garantir a segurança e o bem-estar da população. Nesta segunda-feira (22), a oficina O Desenho de Cidades Seguras, realizada em Belo Horizonte, buscou contribuir para o desenvolvimento dos projetos de mobilidade da cidade e buscar soluções para áreas selecionadas como estudos de caso. O evento é organizado pelo WRI Brasil Cidades Sustentáveis em parceria com a prefeitura, a Fia Foundation e o Solutions.
Belo Horizonte viu sua frota de automóveis passar de 866.304 unidades para 1.714.947 em dez anos, um crescimento de 98%, segundo o Departamento Nacional de Trânsito. A capital mineira vem, então, tentando se moldar para continuar progredindo mesmo com essa quantidade de automóveis. Foi a primeira capital brasileira a elaborar seu Plano de Mobilidade e já reconhece a importância do desenho seguro das vias. Aos poucos, a cidade vem implementando conceitos que estão presentes na publicação elaborada pelo WRI, O Desenho de Cidades Seguras, cujas recomendações foram apresentadas pela Coordenadora de Segurança Viária do WRI Brasil Cidades Sustentáveis, Marta Obelheiro. “Desde 2010, Belo Horizonte vem apresentando uma notável redução no número de vítimas por acidente de trânsito, mas ainda tem muito a ser melhorado. Ninguém deveria estar morrendo no trânsito nas cidades. O objetivo em que precisamos colocar todos os nossos esforços é zerar o número de fatalidades”, afirma.
Marta Obelheiro, Coordenadora de Segurança Viária do WRI Brasil Cidades Sustentáveis (Foto: Nereu Jr.)
Cidades sustentáveis devem ter como prioridade a segurança de pedestres e ciclistas e a priorização do transporte coletivo. Com esse objetivo, alguns elementos-chave são importantes para evitar grandes velocidades dos automóveis e também para facilitar o caminhar ou ainda o pedalar. O tamanho de quadra e a largura das vias devem ser pensadas do ponto de vista de quem caminha, dando oportunidades para travessia, com interseções mais frequentes que obrigam os veículos a pararem. As medidas de moderação de tráfego também são importantes para reduzir as mortes no trânsito. Lombadas, almofadas atenuadoras de velocidade, chicanas, afunilamentos, extensões do meio-fio, travessias de pedestres elevadas, minirrotatórias e rotatórias são apresentadas no guia, bem como dados que comprovam seus benefícios em diferentes cidades onde foram adotadas.
Três outros elementos se combinam no planejamento estratégico das cidades. A conectividade viária aproxima os pontos de interesse e diminui as distâncias a serem percorridas, incentivando o transporte ativo. Dessa forma cria-se um melhor acesso aos destinos de maior interesse de pedestres, como trabalho, escola, estações de transporte coletivo, entre outros. O guia prático também recomenda o fomento da alta densidade populacional, especialmente no entorno de corredores de transporte de massas. "A dispersão urbana está diretamente relacionada ao número de fatalidades no trânsito. Para cada 10 metros adicionais entre interseções semaforizadas, tem-se um acréscimo de 3% de acidentes graves. Por isso precisamos olhar para a forma de construir as cidades”, afirmou Marta. Além disso, segundo ela, cidades mais compactas também têm maior facilidade de criar redes eficientes de trânsito, saneamento, entre outras questões.
Para incentivar o uso da bicicleta, Belo Horizonte trabalha para atingir metas desafiadoras de implantação de ciclovias. Atualmente, a cidade conta com 87,4 quilômetros de rede cicloviária, mas a meta da BHTrans é de que nos próximos três anos esse número chegue a 300 quilômetros. Até 2030, a cidade quer ciclovias e ciclofaixas em toda a rede viária. A Especialista de Segurança Viária do WRI Brasil Cidades Sustentáveis, Shanna Lucchesi, apresentou índices de cidades de diversos países que obtiveram impactos econômicos muito positivos com a implantação de ciclovias. “Nossa estrutura cicloviária ainda está muito aquém do que podemos chegar, está muito atrás na comparação com outros países. Hoje, visamos que o uso da bicicleta chegue a 20% na divisão modal nas nossas cidades. Acreditamos que andar de bicicleta é mais seguro do que de automóvel”, destacou Shanna.
(Foto: Nereu Jr.)
A partir dos conceitos apresentados no início do dia, a segunda parte da oficina dividiu os participantes, todos técnicos da BHTrans, em seis grupos para trabalhar em três interseções críticas para a cidade. A coordenadora do programa Pedala BH, da BHTrans, Eveline Trevisan, apresentou os estudos de caso que estão desafiando os planejadores da empresa de transporte. O cruzamento da Avenida do Contorno com a Avenida Amazonas, um dos pontos selecionados, é um local de muito trânsito de pedestres, com colégios e hospitais. "Esse é um ponto muito complicado de união de duas avenidas importantes da cidade e que não permite tempo para travessia dos pedestres", explicou Eveline.
Os outros dois locais estudados foram na Avenida Antônio Carlos, onde foi instalado o primeiro corredor de BRT de Belo Horizonte, e na Avenida Cristiano Machado. No primeiro caso, travessias de pedestres foram instaladas no corredor, mas, em horários de chegada em massa de estudantes para a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), as faixas não são suficientes e o risco de acidentes é crescente. A Avenida Cristiano Machado fica próxima a um shopping, estações de transporte coletivo e outros pontos de interesse importantes. O local une uma via urbana com uma via rodoviária e é o trajeto principal para o Aeroporto Internacional de Confins. No trecho já existe uma passarela de pedestres, mas essa também não está dando conta do número de pedestres.
"Sempre precisamos pensar exatamente para onde estamos levando o fluxo de pedestres e de automóveis para evitar que outros problemas surjam", lembrou Marta. "Esse é um trabalho muito rico. Temos um material a ser investigado e estudado e iremos fazer isso caminhar na BHTrans", exaltou Eveline. "O resultado desse trabalho é impressionante porque vemos que soluções existem. Só precisamos perder a ilusão de que podemos evitar congestionamentos. O que importa é facilitar a vida daquele que é muito frágil, dos pedestres e ciclistas, que são os que estão perdendo a vida. O que vale mais, uma vida ou uma hora a mais no trânsito?", questionou.
(Foto: Nereu Jr.)