Nova Agenda Urbana: o desafio de levar os objetivos globais para a escala local
No ano passado, Quito, no Equador, recebeu representantes do mundo todo que se comprometeram a buscar um modelo mais sustentável de cidade nas próximas duas décadas — visão registrada na Nova Agenda Urbana (NAU). A Habitat III, Conferência da ONU para a Habitação e o Desenvolvimento Urbano Sustentável, ficou marcada pela assinatura desse documento que representa um consenso entre líderes globais, prefeitos, acadêmicos e ativistas. Mas, apesar da euforia pelo sucesso da conferência nesse aspecto, o histórico encontro se encerrou com uma dúvida no ar: e agora, como fazer com que tais objetivos se tornem realidade?
O IV Encontro dos Municípios com o Desenvolvimento Sustentável (IV EMDS), por reunir as principais lideranças das cidades brasileiras, se mostrou um ótimo espaço para essa discussão. Mais do que apenas compromissos, a Nova Agenda Urbana trouxe consigo oportunidades econômicas para os municípios. Focados no ambiente urbano, os objetivos acordados incluem erradicar a pobreza em todas as formas e dimensões, reduzir as desigualdades, promover o crescimento inclusivo e atingir o desenvolvimento sustentável.
O WRI esteve em Quito, participou da elaboração da Nova Agenda Urbana e permanece debatendo globalmente a sua implementação. O diretor global do WRI Ross Centro Para Cidades Sustentáveis, Ani Dasgupta, tem participado de discussões sobre o tema pelo mundo e trouxe à Brasília uma visão global para um desafio que deve agora ser enfrentado na escala local. Ele participou de uma mesa sobre as oportunidades econômicas geradas pelo acordo selado no Equador ao lado de Tatiana Araújo, assessora de Projetos Institucionais do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS); Anne Odic, líder de Governos Locais e Desenvolvimento Urbano da Agência de Desenvolvimento Francesa (AFD); Maria Eliana Jubé, arquiteta do Conselho dos Arquitetos do Brasil e o diplomata brasileiro Nicola Speranza.
O Brasil tem legislações modernas, como o Estatuto das Cidades e da Metrópole, por exemplo, que se fossem implementadas já colocariam o país no rumo de um desenvolvimento mais sustentável para as cidades. Maria Eliana destacou que a imensa maioria dos municípios brasileiros têm menos de 50 mil habitantes e não conta com o mesmo tipo de acesso aos recursos financeiros das metrópoles.
Uma das preocupações dos palestrantes é que os conceitos da Nova Agenda Urbana de dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável não fiquem apenas em discussões de âmbito federal, mas também cheguem ao nível local. Ani Dasgupta destacou que a NAU tem muitos parágrafos - 107 no total -, resultado da contribuição dos mais diversos atores, mas que o acordo poderia ser resumido da seguinte forma: "Precisamos construir cidades que funcionam para os negócios, para o ambiente e, mais importante, para as pessoas. É disso que a Nova Agenda Urbana trata".
Ani Dasgupta destacou a importância de se pensar cidades com desenvolvimento focado nas pessoas (foto: Mariana Gil/WRI Brasil)
Para o diretor global do WRI, o grande resultado de Quito foi o consenso sobre a importância das cidades para o desenvolvimento sustentável do planeta, o que está em sintonia com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável e com o Acordo de Paris. "Nosso trabalho ajuda as cidades a priorizarem o que é mais importante para chegarmos a todos esses objetivos. Se a base estiver muito bem feita, o resto virá depois", destacou Dasgupta.
Tatiana também ressaltou como ainda é necessário desmistificar essas agendas globais para municípios do interior. "Estamos falando de uma agenda global, mas para as cidades, implementar a legislações já existentes, como Estatuto das Cidades, as políticas nacionais de resíduos sólidos e de recursos hídricos, por exemplo, já é uma forma de refletir a agenda global", afirmou Tatiana.
Anne Odic explicou como a AFD prioriza o financiamento de projetos sustentáveis, com visão de longo prazo, como, por exemplo, eixos de transporte que contribuam com o adensamento e o desenvolvimento urbano. Um outro exemplo levantado por ela foi o de Paris na década de 1950, que realizou projetos de habitação social em áreas afastadas do centro da cidade, algo que precisou ser trabalhado décadas à frente. Segundo Anne, a capital francesa tem, atualmente, uma política de habitação social na região central da cidade baseada em aluguel. "As cidades não podem mais se espraiar. Pode parecer mais oneroso pelo custo do solo, mas a longo prazo o custo para fornecer serviços na periferia é muito maior do que nos centros das cidades", lembrou Anne.
Em sua mensagem final, Ani Dasgupta ressaltou a relevância de se buscar o desenvolvimento de cidades mais compactas, coordenadas e orientada para as pessoas. "Brasília é um exemplo fantástico de cidades que não devemos mais construir, pois é totalmente voltada para os carros. Passamos os últimos 80 anos fazendos cidades pensando nos carros. É hora de fazermos cidades para pessoas", concluiu Ani.
As atividades do WRI Brasil no EMDS são apoiadas por: CIFF (Children's Investment Fund Foundation), Stephen M. Ross Philanthropies, ICS (Instituto Clima e Sociedade), Fedex Express, Arconic Foundation, BMZ (Ministério Federal de Cooperação Econômica e Desenvolvimento da Alemanha), GIZ, Citi Foundation, Centro de Excelência ALC-BRT e UNEP.