Investir em construções eficientes é pensar no meio ambiente e na economia, diz Eric Mackres
A forma como estamos construindo nossas áreas urbanas faz delas as responsáveis por 75% das emissões de gases de efeito estufa no mundo. Isso significa que muito ainda precisa mudar. Além da poluição causada pelo uso desenfreado de carros, uma grande parcela dessas emissões vem das nossas construções. Um estudo da Agência Internacional de Energia (IEA) mostra que o mundo pode reduzir até 83% das emissões atuais de CO2 até 2050 ao implementar medidas de eficiência energética no setor da construção ao conter a liberação de mais de 5,8 bilhões de toneladas de gases poluentes. A Iniciativa para Construções Eficientes do WRI Ross Center for Sustainable Cities trabalha para esta estatística virar realidade. Presente no evento Construction Summit 2016, promovido pela Sobratema, o Gerente da Iniciativa, Eric Mackres (foto abaixo), falou sobre como convencer diferentes atores a tomar medidas para tornar as construções mais eficientes e como esse trabalho pode impactar a realidade.
Quais são os principais projetos desenvolvidos pela Iniciativa para Construções Eficientes do WRI Ross Center for Sustainable Cities?
Meu trabalho no WRI é ajudar países e cidades a entender as oportunidades trazidas pela eficiência energética em construções, ajudando-as a identificar ações que são alcançáveis e que terão impactos significativos para proteger o meio ambiente, ajudar a economia e obter benefícios sociais.
Um dos nossos principais projetos é o Building Efficiency Accelerator, uma parceria de mais de 30 organizações e 23 governos subnacionais de todo o mundo que se comprometeram a criar e implementar uma política para melhorar a eficiência e produzir relatórios para o acompanhamento desse progresso. Essa parceria tem ajudado esses locais a cumprirem tais compromissos. O WRI e o time que eu trabalho coordena os esforços das outras organizações envolvidas. O Brasil tem uma cidade parceira, Porto Alegre, e temos outros parceiros em outros diversos países.
Outro grande projeto é ajudar a avançar as conversas com importantes stakeholders, que influenciam os tomadores de decisões em construções, os governos nacionais e subnacionais e até os proprietários de prédios, os gerenciadores e as companhias que fornecem produtos e serviços para criar construções mais eficientes. Esse é o trabalho que desenvolvemos, de diversas formas, na Índia, no México e, espero que em breve, no Brasil.
Para dar um exemplo específico, temos na Cidade do México o WRI coordenando um esforço com partes interessadas locais para ajudar o governo a mudar práticas em prédios públicos, melhorar o gasto energético de prédios municipais, e também implementar, pela primeira vez, algumas normas de construções na cidade. Uma delas inclui a eficiência energética como critério para se certificar de que novas obras estão economizando energia e dinheiro.
Quando se trata de deter tecnologia e recursos para desenvolver construções mais eficientes, você acredita que existem muitas diferenças entre países ricos e países emergentes?
Países têm diferentes climas e distintas formas de agir, então também têm tecnologias e práticas diferentes. Certas tecnologias não estão disponíveis em economias emergentes. Mas, o fator mais significante pelo qual acredito que a eficiência energética em construções ainda não esteja prevalecendo é porque economias emergentes precisam mudar o pensamento usual sobre o setor de construções. Pensar não apenas no que é necessário para construir um prédio, mas o que é necessário para aquele prédio manter seu valor por toda sua vida útil. Edificações, uma vez que são construídas, têm uma vida útil de, pelo menos, 40 anos, às vezes mais de 100 anos.
O impacto gerado na construção de uma edificação representa apenas uma pequena parte da energia, dos recursos, das emissões de CO2 e do dinheiro que são gastos nela. O impacto maior depende dos custos que ele terá durante toda sua vida útil. Projetando e construindo uma ótima edificação você poderá reduzir esses custos e diminuir o impacto dela durante o passar dos anos.
Leva tempo para alinhar interesses e achar formas institucionais ou legais de se certificar que os benefícios de edificações mais eficientes são compartilhados. Além disso, muitas vezes empresas e responsáveis políticos enxergam a importância dessa questão, mas tem outros problemas cotidianos mais urgentes que precisam resolver.
Você acredita que estabelecer normas ou códigos possa ser a solução?
Sim, definitivamente é parte da solução. Alguns dos mais efetivos mecanismos políticos para eficiência energética ao redor do mundo são códigos de construções e normas de produção e equipamentos. Essas são medidas obrigatórias para oferecer guias de como novas edificações devem ser feitas e quais materiais e aparelhos devem ser utilizados neles. Essas são políticas fundamentais. O desafio dos códigos desenvolvidos ao redor do mundo é basicamente como eles serão aplicados.
Normas são geralmente desenvolvidas em nível nacional e a expectativa é que elas sejam implementadas em nível estadual e municipal. Porém, muitas vezes essas escalas não têm recursos e capacidade para desenvolver um bom trabalho seguindo as normas de construção. Em economias que estão a emergir rapidamente, uma das melhores oportunidades é ter normas claras e uma boa forma de implementar esses códigos e padrões de construção.
Como podemos tornar essa questão de eficiência energética em construções tão disseminada e tão presente nas discussões como as questões que envolvem mobilidade urbana, por exemplo?
Acredito que esses debates já estão ocorrendo em algumas comunidades, particularmente entre os setores da construção civil que estão interessados em edificações verdes. Acho que precisamos fazer as pessoas pensarem nos benefícios que esses espaços oferecem para o público. Edificações são lugares em que a maioria das pessoas passa a maior parte do tempo. Nos Estados Unidos, por exemplo, as pessoas permanecem mais de 80% do tempo dentro de prédios. Ou seja, isso significa um grande impacto na saúde da população, no bem-estar, na produtividade de cada um e no quanto podem contribuir economicamente.
Sei que uma grande parcela pensa apenas em questões de transporte, em como a mobilidade impacta a vida das pessoas, mas nós precisamos começar a fazê-las pensar dessa forma em relação às construções. Não apenas pensar em benefícios próprios, em benefícios ambientais, mas também em impactos econômicos e sociais. Se existe a chance de uma cidade gastar menos em energia e recursos, isso pode contribuir muito economicamente. Ao demostrarmos os benefícios proporcionados por edificações eficientes em energia, podemos suscitar mais conversas sobre o assunto.
Como podemos mostrar aos investidores que o custo extra das construções sustentáveis vale a pena?
Essa é uma questão importante. A primeira coisa é mostrar que não necessariamente existe um custo-extra. Muitas vezes você pode fazer uma edificação eficiente com um custo semelhante ou até menor do que uma construção habitual. Quando você pensa na construção sob uma perspectiva holística, você projeta elementos da edificação para que eles funcionem bem juntos. Por exemplo, você tem um prédio que está usando ventilação e luz natural para manter a temperatura e, assim, você precisa de menos sistemas de aquecimento e menos ar-condicionado e, consequentemente, gasta menos nesses componentes do prédio.
Temos muitos exemplos de edificações eficientes que são na verdade mais viáveis de construir e muito mais viáveis a longo-prazo porque reduzem o custo operacional do local, o uso de energia, de manutenção e de outros elementos. No entanto, nem todas as construções possuem esse custo inicial tão viável, mas todos precisam ter em mente que essas despesas extras serão recuperadas mais à frente. Esses gastos adicionais geralmente se pagam em um até cinco anos, ou seja, durante uma parcela muito pequena da vida útil dos empreendimentos. Nós apenas precisamos nos certificar de que os investidores entendam e comuniquem isso.
E quais medidas poderíamos adotar para adaptar construções antigas?
Existem muitas maneiras e tecnologias de aprimorar antigas construções. O primeiro passo é entender como são feitos os usos de energia e recursos do local. Isso inclui análises comparativas do histórico de uso, entender os padrões de uso daquele local, ou seja, quantas pessoas utilizam, por quantas horas, que tipo de energia é usada para o quê - seja para iluminação, refrigeração, aquecimento -, e então ver esses fatores como oportunidades. Por exemplo, se for um grupo de prédios, detectar quais podem se beneficiar mais comparados a outros similares e, então, identificar as ações que podem ser tomadas naquele local específico. Cada construção é diferente, assim como cada pessoa. Por isso é fundamental perceber o que é único naquela edificação, o que está funcionando bem e o que pode ser melhorado. Essas melhorias podem ser operacionais ou mais complexas, como melhorar instalações nas paredes, por exemplo, ou janelas. Existem muitas opções.